Quando se começou a falar em preservação da natureza, no fim dos anos 60, os ambientalistas eram vistos como seres exóticos. Na época, derrubar florestas para erguer cidades era uma boa ideia e nem se falava em aquecimento global. Hoje, a preocupação com o ambiente está na ordem do dia e os ambientalistas conquistaram respeito. Isso não impede que parte deles insista no figurino da extravagância. A toda hora grupos ambientalistas se engajam em campanhas cuja racionalidade é difícil de entender, seja pelos objetivos que perseguem, seja pelos métodos utilizados para alcançá-los. A mais recente dessas campanhas, promovida pelo Greenpeace, tem como meta impedir que se use para os devidos fins o papel higiênico ultramacio, formado por duas camadas de folhas. Nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, os papéis higiênicos mais caros têm três e até quatro camadas de folhas.
A reclamação se deve ao fato de que esse tipo de produto não pode ser feito com papel reciclado. Sua produção exige fibras de celulose virgens, o que significa sacrificar toneladas de árvores. O Greenpeace alega que, nos Estados Unidos, boa parte da madeira usada para fabricar os rolos de papel higiênico é tirada das florestas nativas do norte do Canadá, importantes na absorção do dióxido de carbono (CO2), o principal gás do efeito estufa. E o que dizer das árvores plantadas exclusivamente para a produção de papel, em áreas de constante reflorestamento? Também estão na lista negra dos ambientalistas extremados porque, segundo dizem, áreas de monocultura não servem de habitat para variedades grandes de animais. Enfim, a tese é que, para estar em paz com o planeta, é preciso usar papel higiênico do tipo áspero.
A proteção das baleias, velha bandeira do Greenpeace, é de motivação justa e cristalina, e todo mundo aplaude. Mais difícil é entender tanto esforço para banir do planeta o papel higiênico macio, um conforto conquistado pela civilização. A justificativa dos ambientalistas radicais é daquele tipo de formulação que parece bem embasada, mas não resiste a análise rigorosa. Só uma parte ínfima do papel macio é feita com celulose de florestas nativas, e assim mesmo localizadas em áreas com licença ambiental. Papel higiênico de qualidade não pode ser produzido apenas com papel reciclado, pois o produto resulta frágil e áspero. A campanha contra o papel higiênico conseguiu uma vitrine para suas ideias na última cerimônia de entrega do Oscar, ocorrida há um mês. O papel higiênico que equipava todos os banheiros do Kodak Theater era feito de celulose 100% reciclada. Vida de artista é uma dureza.
A preservação do ambiente é o Zeitgeist – o "espírito do tempo", expressão criada pelos filósofos alemães – da nossa era. Mas, quando alguns extremados, imbuídos de fúria doutrinária, querem impor suas convicções a qualquer custo, a militância ambientalista parece uma maluquice a mais da vida moderna. A ação violenta da Peta (sigla em inglês para Pessoas pelo Tratamento Ético aos Animais), por exemplo, é do tipo que provoca repulsa. Seus militantes invadem desfiles de moda e atacam na rua pessoas que estejam vestidas com casaco de pele. Em novembro do ano passado, o braço brasileiro do grupo Frente de Libertação Animal invadiu um laboratório do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo e destruiu material de pesquisa, equipamentos e computadores. O resultado prático de campanhas ambientalistas radicais costuma ser nulo, principalmente quando elas pretendem acabar com confortos escolhidos mais pelo valor simbólico do que pelo dano real causado ao ambiente, como é o caso do papel higiênico. Em 2007, uma série de campanhas nos Estados Unidos pretendia conscientizar a população da inconveniência de consumir água mineral em garrafas plásticas, já que elas produzem uma quantidade enorme de lixo não degradável. Desde então, o consumo de água engarrafada no país cresceu 6,7%. Pode-se apostar que a campanha pelo papel higiênico áspero terá o mesmo desfecho.
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