A Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) afirmou nesta segunda-feira que vai investigar a denúncia feita pelo jornal britânico "The Guardian" de que rejeitou os pedidos de socorro de um navio que levava imigrantes africanos da Líbia para a ilha italiana de Lampedusa. Segundo o jornal, que cita testemunhas, ao menos 62 pessoas morreram de sede e fome.
O "Guardian" afirma que o barco levava 72 pessoas, incluindo várias mulheres, crianças e refugiados políticos. Ele teve problemas pouco depois de deixar Trípoli, em 25 de março, rumo à Lampedusa, ilha italiana que sofre com o fluxo de dezenas de milhares de refugiados do norte da África desde a onda de revoltas que varreu a região.
A tripulação do barco enviou um alerta à Guarda Costeira italiana e tentou contato com um helicóptero militar e um barco da Otan, mas nenhum esforço de resgate foi feito.
Apenas dez dos tripulantes sobreviveram aos 16 dias à deriva no mar Mediterrâneo, afirma o jornal britânico.
"Nós estamos investigando as alegações do Guardian. Eu espero ter uma resposta em breve", disse a porta-voz da Otan, Carmen Romero. "Os veleiros da Otan estão conscientes de suas responsabilidades a respeito da lei marítima internacional sobre a segurança das pessoas no mar".
A lei marítima internacional obriga todos os barcos, incluindo os militares, a atender chamados de socorro dos barcos que se encontram nas proximidades e prestar auxílio.
A reportagem do "Guardian" cita sobreviventes e outras pessoas que entraram em contato com os passageiros do barco. Segundo o jornal, havia 47 etíopes, sete nigerianos, sete eritreus, seis ganenses e cinco sudaneses. Destes, 20 eram mulheres e dois eram crianças, incluindo um bebê de um ano.
O capitão do barco, um ganense, rumava a Lampedusa, 290 km ao noroeste de Trípoli, mas depois de 18 horas teve problemas e começou a perder combustível.
O capitão do barco, um ganense, rumava a Lampedusa, 290 km ao noroeste de Trípoli, mas depois de 18 horas teve problemas e começou a perder combustível.
Os imigrantes usaram um telefone via satélite para ligar para Moses Zerai, um padre eritreu em Roma que comanda a organização de direitos dos refugiados Habeshia. Ele então contatou a Guarda Costeira italiana.
Segundo o "Guardian", o barco foi localizado a cerca de 97 km da costa de Trípoli e a Guarda Costeira garantiu a Zerai que um alerta fora enviado.
O jornal diz ainda que um helicóptero militar com a palavra "Exército" na fuselagem logo apareceu acima da embarcação. Os pilotos, que usavam trajes militares, deixaram água e pacotes de biscoito no barco e gesticularam aos passageiros que ficariam até que um barco de resgate aparecesse.
O helicóptero, contudo, foi embora e a ajuda nunca chegou.
Dias depois, em 29 ou 30 de março, o barco se aproximou de um porta-aviões da Otan. Segundo o relato dos sobreviventes, dois jatos sobrevoaram a embarcação, enquanto eles seguravam as duas crianças para o alto.
Nenhuma ajuda veio e os passageiros começaram a morrer um a um. "Cada manhã, ao acordarmos, encontrávamos mais mortos, que deixávamos a bordo vinte e quatro horas antes de jogá-los no mar", relatou ao jornal Abu Kurke, um dos sobreviventes.
Em 10 de abril, o barco chegou à cidade líbia de Zlitan, perto de Misrata, com apenas 11 pessoas vivas. Um deles, contudo, morreu quase imediatamente depois de chegar em terra firme.
FRANCÊS - O "Guardian" diz que após extensa investigação descobriu que o porta-aviões é provavelmente o francês Charles de Gaulle, que estava operando no Mediterrâneo.
O Charles de Gaulle faz parte da operação internacional da Líbia, mas não está sob comando direto da Otan.
A porta-voz da aliança disse que o único porta-aviões que faz parte da operação na Líbia é um italiano.
Ela disse ainda que, nas noites de 26 e 27 de março, várias unidades da Otan estavam envolvidas no resgate de mais de 500 pessoas em dois veleiros com imigrantes em uma área a 28 km ao norte de Trípoli.
"As pessoas resgatadas foram transferidas para Lampedusa com a ajuda das autoridades italianas", disse.
CRISE HUMANITÁRIA - Cerca de 25 mil fugiram para a pequena ilha italiana de Lampedusa, que fica mais perto do norte da África do que da Itália continental. A ilha tem apenas 5.000 habitantes e nenhuma estrutura para abrigar tantos refugiados.
O governo italiano alegou que não tinha como acolher tanta gente e que temia a vinda de 1,5 milhão para suas terras com a queda sucessiva de ditadores no continente vizinho.
Pelas regras da União Europeia (UE), os imigrantes têm de ficar no país em que aportaram até que sejam devolvidos a seus locais de origem ou que seja concedido asilo ou visto.
Berlusconi apelou por ajuda dos demais membros do bloco europeu, mas não obteve resposta e resolveu conceder documentos temporários de permanência, o que permite a imigrantes circular pelos países signatários do Tratado de Schengen.
A decisão levou a reações duras dos vizinhos, que temiam "adotar" o problema italiano, principalmente da França, destino preferencial dos tunisianos.
Há duas semanas, a França chegou a bloquear por meio dia o tráfego de trens com a Itália para impedir a entrada desses tunisianos recém-documentados. O país alegou "razões de ordem pública" e disse que eles só poderiam entrar se comprovarem ter condições financeiras de se sustentar.
Na semana passada, Itália e França decidiram em conjunto pedir que a União Europeia rediscuta o tratado que permite a livre circulação de pessoas entre 25 países do continente.
Conhecido como Tratado de Schengen (cidade em Luxemburgo onde foi assinado), o acordo é um dos pilares da UE, abolindo na prática as fronteiras internas entre os países signatários --qualquer um viaja sem a necessidade de passaporte ou visto.
Agora, os dois países falam em retornar o controle fronteiriço em "circunstâncias excepcionais". FONTE: AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS
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